Overblog
Editer l'article Suivre ce blog Administration + Créer mon blog
O acendedor de lampiões

Mauritânia: será que a sociedade civil pode constituir um horizonte das mudanças políticas e sociais?

2 Juin 2024 , Rédigé par Jorge Brites Publié dans #Democracia, #África, #Sociedade

« Eu não tava na oficina: eles não ofereciam per diem, não era interessante. »

Estas palavras, pronunciadas em Nouakchott há alguns anos por um membro de uma organização dos direitos humanos que tem uns 30 anos de idade, respetada e presidade por uma personalidade várias vezes decorada, pode constranger qualquer um que não seria acostumado com o meio associativo mauritano. Para quem a frequenta, no entanto, ela pode parecer anodina, e ilustra uma sociedade civil globalmente desacreditada. Contudo, num contexto de regime militar que permanece desde o final da década de 1970 – com excepção a parêntese de 2007-2008 – e de sistema social profundamente marcado pelo tribalismo e as desigualdades sociais, a necessidade de uma sociedade civil forte, capaz de pressionar com coesão o poder político e de propor uma visão alternativa agludinadora, poderia aparecer importante. De fato, a ação ativista, o trabalho social, a criação artística, as estratégias de advocacia, são naturalmente portadores de diversidade e ilustram mais a complexidade e a riqueza do país – ao contrário do controlo do poder político ou do poder económico por umas famílias. Mas, num país que contava mais de 8 000 associações apenas em 2014, o impacto e a influência de uma sociedade civil ativa ainda devem ser desmostrados.

Em qual estado está a sociedade mauritana? Será que o modelo associativo (por grande parte importado do direito civil da antiga potência colonial, a França) corresponde à forma relevante de organização, para levar ideias e agir no terreno social e cultural? Será que a ajuda pública ao desenvolvimento prejudica o surgimento de uma sociedade civil autónoma em termos inteletuais?

Entendemos por sociedade civil o conjunto de atores não estatal que participam à vida política, social e cultural do país, e cuja ambição é contribuir a uma forma de progresso coletivo, ou pela realização de atividades, ou por ações de advocacia e a a defesa dos direitos: as associações, os sindicatos de trabalhadores, os atores culturais, os movimentos ativistas informais, os ativistas e bloguistas, etc. Não incluiremos os partidos políticos, os quais têm a preocupação eleitoral como especificidade, nem as empresas privadas e as cooperativas, as quais têm um objetivo particular, ou seja, a rentabilidade (ou até a realização de lucros). Não trataremos também dos atores religiosos como os imames.

Debate informal organizado entre ativistas da sociedade civil, sobre a reforma das autarquias, em Nouakchott em 2018.

Debate informal organizado entre ativistas da sociedade civil, sobre a reforma das autarquias, em Nouakchott em 2018.

Há vários anos, criaram-se na Mauritânia muitas associações nas aldeias, para favorecer os pedidos de autorização ao pé das autoridades públicas quando devem organizar-se eventos culturais. Mais recentemente, em particular desde 2013, desenvolveu-se um tecido associativo importante em contexto urbano, levado por grande parte pela juventude, em resposta às faltas das autoridades públicas (o Estado e os municípios notavelmente), por exemplo durante inondações após fortes chuvas, como foi o caso em Nouakchott nos bairros de Basra e Socogim, ou ainda para operações de saneamento e de coleta de resíduos sólidos em tal ou tal bairro. Essas associações, muitas vezes levadas por jovens figuras mais ou menos carismáticas, capazes de mobilizar camaradas no seu bairro, são raramente reconhecidas pelo Estado – na medida em que o processo de reconhecimento não é declarativo e pode demorar meses, ou até anos em função das relações que têm na administração, e às vezes do suborno que podem oferecer.

Sobretudo, no longo prazo, elas enfrentam dificuldades para construir uma visão e uma estratégia de ação que lhes permite chamar a atenção das autoridades públicas, além das suas ações pontuais. Com o tempo, o desemprego crônico ajudando, muitas dessas associações servem de impulso para aceder a financiamentos vindo da cooperação internacional – os doadores e financiadores, e as ONG, interessem-se cada vez mais às temáticas ligadas à juventude (em particular desde os movimentos da Primavera árabe que lembrou que muitas pessoas insatisfeitas e fisicamente em boas condições eram capazes de destabilizar sistemas corruptos).

Este tecido associativo enfrenta muitas vezes uma geração mais antiga de ativistas dos direitos humanos, que lideram organizações não governamentais, que não olham com benevolência a concorrência dos mais jovens para o acesso aos financiamentos. Além disso, a sua vocação humanista parece ter mais ou menos enfraquecido a medida que o seu modo de vida melhorava ao ritmo das prestações de serviço e das missões, dos per diem e das indemnizações, « motivações » e outros emolumentos caraterísticos da cooperação internacional – é preciso dizer que as novas gerações acostumam-se a isto muito depressa, elas também. Temos aqui uma variedade de ONG dos direitos humanos e defendedores da democracia, sempre presentes nos colóquios e conferências organizados nos hotéis de Nouakchott. Essas organizações, que surgiram há alguns anos durante momentos de relaxamento com o poder ou de democratização, entretem desde então um tipo de monopólio da representação em relaçéao ao regime militar e aos financiadores internacionais. Isso, apesar da ausência de reflexão séria sobre os impatos reais da sua (in)ação, en termos de direitos humanos e de democracia (Será que os « atores do desenvolvimento » devem rever o seu estilo de vida?).

Umas organizações desmarcam-se por um trabalho de terreno discreto mas bem real, como Pares Educadores, ou Iniciativa para o Desenvolvimento, mais é preciso constatar que elas são longe de representar a maioria. Pior, as associações de jovens mais recentemente criadas têm a tendência a repitir os mesmos maus hábitos: ausência de renovação da direção interna (às vezes, autoritarismo da ou do presidente), ausência de transparência sobre os financiamentos (que tornam-se um objetivo em si, às vezes ao custo da temática e dos objetivos iniciais da associação), etc. Organizações de jovens adquiriram com o tempo uma visibilidade apreciável, justificada pela sua presença no terreno, e multiplicaram as temáticas de intervenção, tratando de assuntos tão diversos como a saúde, a alimentação, o emprededorismo, a cultura, a luta contra a radicalização religiosa ou simples atividades vazias de sensibilização. Uma tal disperção é feita para assegurar à associação que ela não seja em falta de oportunidade de financiamento por eventuais financiadores.Em muitos dessas « associações de jovens » (mas dirigidas por pessoas cada vez menos jovens com os anos), a renovação da « mesa » da associação parece nem ser um assunto, e isso ainda mais quando a associação beneficia de uma certa visibilidade, pois então ela torna-se um tranpolim e uma carta de vísita apreciável para a ou o presidente (a ou o qual monopoliza muitas vezes a sua representação oficial, e portanto as vantagens que a acompanham). Sobre este assunto, uma lembrança da repartição das tarefas e das restrições de mandatos, como previstas nos estatutos e no regulamento das associações, seria bastante necessário – tal como uma releitura da definição do título de « presidente », o qual não significa « monarco absoluto ». Esta postura muitas vezes de monopólio e autoritária de jovens autoproclamando-se « líderes » explica provavelmente que duas personalidades fortes nunca convivem muito tempo na mesma associação.

Este duplo fenômeno de apropriação e de personalização das associações é problemático. Revela as motivações reais de muitos ativistas, que parecem em contradição com o espírito que deveria liderar o tecido associativo – o qual, só, pode permitir uma ação coletiva no longo prazo. Qualquer um frequentando o meio associativo mauritano conhece bem a questão que surge sistematicamente quando é questão de uma associação: « É para quem, esta associação? » Entender: quem é a ou o presidente?

Finalmente, a postura sendo essencial, assiste-se a uma apropriação das temáticas e do vocabulário pelas associações que deixa perplexo – temáticas e volabulário muitas vezes de novo na moda graças aos financiadores, primeiramente a União Europeia. Muitos Mauritanos até falam, sobre isso, « camaleões » para qualificar atores associativos. Dai, um questionamento limitado sobre o impacto verdadeiro das suas ações e dos seus projetos. A temática da radicalização (no contexto do G5 Sahel) impôs-se por exemplo há alguns anos, permitindo o surgimento de muitos « peritos », sem competência real no assunto. Outro exemplo: o emprededorismo, assunto muito na moda, que justifica-se por um pedido regular dos jovens a aceder a formações profissionais e a um emprego sustentável numa economia amorfa. Várias associações apropriaram-se o conceito de « incubador de empresas » e querem acompanhar jovens emprededores. Elas não hesitam a afoirmar que já acompanharam tal número de jovens... sem detalhar o número de empresas (lucrativas) realmente criadas após os processos de acompanhamento – uma informação que ninguém pede, ou por desinteresse, ou para não incomodar.

Neste universo desenvolvimentalista, « projetos », « beneficiários », « parceiros técnicos e financeiros », « quadro lógico », « sensibilização » ou « conscientização », « capacitação », « oficinas de lançamento » ou « de encerramento » tornam-se palavras usuárias do vocabulário, cujo questionamento parece uma blasfémia – tel como o seria, em qualquer atividade, a ausência de faixas, cartazes, kits participantes (incluindo uns caderninhos e canetas), garrafas de água e lanches, cartões ou listas de presença... e obviamente, de indemnização aos participantes, os famosos per diem.

Atividade da associação dos jovens da aldeia de Thialgou, perto da cidade de Boghé, na Região (Wilaya) do Brakna, em 2018.

Atividade da associação dos jovens da aldeia de Thialgou, perto da cidade de Boghé, na Região (Wilaya) do Brakna, em 2018.

Uma comunitarização das associações e um envolvimento limitado, que prejudicam a luta pelos diteiros

Um escolho importante vem acrescentar-se a esta personalização e a práticas pouco democráticas: a maioria das organizações da sociedade civil, tal como a sociedade, são caraterizadas por uma forte comunitarização. Ela é acentuada por um uso pouco equilibrado das línguas nacionais ou do francês. As associações de aldeia (muitas vezes pilotadas por pessoas morrendo em Nouakchott e que só vão na aldeia pontualmente) são obviamente as mais marcadas (o que é lógico, pois as aldeias apresentam muitas vezes uma composição comunitária), mas na verdade todas as áreas conhecem o fenômeno: as ONG sobre os direitos humanos, as associações de jovens trabalhando sobre o saneamento, as sobre as deficiências, os movimentos feministas, os sindicatos de trabalhadores, etc. As excepções são raras, e têm a ver a maioria das vezes com organizações que evoluirem em ONG de desenvolvimento, que funcionam mais ou menos como empresas e cuja prioridade é contratar agentes na base das suas competências.

Se acrescentamos a esta pintura a falta óbvia de motivação ideológica de muitos ativistas, as perspetivas do meio associativo mauritano não parecem nem claras, nem positivas. Certamente, é bom constatar a presença de jovens no terreno, pá e carrinho de mão nos braços, para limpar o seu bairro, ou distribuir comida e roupas durante o Ramadão (embora o número de selfies partilhados nas redes sociais nessas ocasiões deixa às vezes intrigado). Mas infelizmente, essas ações coletivas não permitem criar uma reflexão mais avançada sobre as desigualdades sociais, sobre a condição das famílias, sobre a economia de escassez que instalou-se nos bairros periféricos de Nouakchott e em centenas de aldeias, ou ainda sobre a falta de serviços públicos básicos. O fraco nível de instrução (resultando do colapso da Escola pública nos últimos anos na Mauritânia) não ajuda, e falta a esta juventude uma politização que lhe permitisse organizar-se em movimento de contestação construtivo, para levar revindicações claras e ideologicamente coerentes.

Quantos aos movimentos ativistas de juventude espicicamente políticos, como o Movimento do 25 de Fevereiro nascido com a Primavera árabe de 2011, ou os núcleos marxistas e feministas (Mauritânia: será que a juventude pode contribuir à mudança?), não só o seu número não lhes deixa a oportunidade de pesar no balanço, mas ainda mais, a sua atividade resume-se a maioria das vezes a trocas nas redes sociais e a uns debates no café ou de salão – o que cria obviamente um entre-si inteletual, dificilmente compatível com a definição de uma estratégia de ações de terreno que lhes permite adquirir uma legitimidade ao pé dos habitantes, e portanto de ser ouvidos.

As associações próximas dos movimentos islamistas, e às vezes financiadas por financiadores dos países do Golfo, são provavelmente as organizações que associam melhor um discurso ideológico construido e uma ação de terreno eficaz – com muitas iniciativas caritativas, e até clínicas, redes de ensino religioso, um acesso ao financiamento islâmico, etc. Do outro lado, a ausência no terreno dos ativistas reclamando-se de um pensamento « de esquerda » é ensurdecedor. Uma organização, a Fundação Sahel, capitaliza certamente sobre o surgimento das revindicações à comunidade haratine (antigos escravos da comunidade moura), mas o seu impacto permanece limitado. No entanto, poderia-se imaginar que o surgimento de uma consciência haratine mobilizada contra qualquer forma de opressão, inclusivo as práticas persistantes de escravatura e o racismo, pode constituir um fator de mobilização social que acompanha-se de um trabalho importante de terreno, e que reune além dos Haratines. Esta perspetiva permanece, contudo, a construir, sem esquecer que na liderança nesta comunidade, não falta divisões – aliás, a Fundação Sahel foi criada por dissidentes da Iniciativa pelo Ressurgimento do movimento Abolicionista (IRA), organização dirigida pelo ativista anti-escravatura Biram Dah Abeid (antigo candidato à eleição presidencial).

Se pegamos o exemplo dos movimentos feministas (embora o número de membros justifica mal a palavra « movimentos »), é necessário constatar que as ações de terreno permanecem raras. Sobretudo, são caraterizados por altercações pessoais que prejudicam a luta e limitam qualquer ação importante. Umas ONG realizam um trabalho concreto de terreno que permite, entre outras coisas, um acolhimento mínimo para as mulheres vítimas de violências sexuais, um acompanhamento jurídico e uma advocacia em favor de uma legislação mais dura contra as violências de género. Contudo, as rivalidades entre figuras desses movimentos são conhecidas e desservem, claro, as causas que elas pretendem defender. Cada uma pretende ser a primeira a ter defendido as mulheres vítimas de violências, e tem um discurso que tenta desacreditar o trabalho da outra. Uma tal rivalidade existe também nas jovens gerações, que nem podem pretender ter realizado o trabalho assumido pelas mais idosas; é o que explica, em muitos desses movimentos, ao mesmo tempo o número fraco de membros, a inconstância do envolvimento e os limites da sua ação (muitas vezes limitada càs redes WhatsApp e Facebook). Finalmente, tal como grupos marxistas ou laicas, o envolvimento das ativistas feministas parece muitas vezes resumir-se a uma adição de posturas individuais.

A necessidade de uma sociedade civil mais solidária para construir uma alternativa ao poder político

Em 2019, a Muritânia viu o seu futuro próximo ancorado na continuidade, com a eleição do presidente Mohamed Cheikh El-Ghazouani, um general que sucedeu a um outro e que parece com pouca pressa para mudar um sistema social muito desigual e um regime político controlado pelos militares. A vida política parecendo pouco favorável à mudança, a sociedade civil poderia constituir o estafeta de uma contestação e de uma raiva latentes.

Exemplos de mobilização da sociedade civil na sub-região podem inspirar os ativistas mauritanos. Foi o caso da Guiné em particular, na ocasião da greve geral de Janeiro e de Fevereiro de 2007, e de novo em 2009 para pressionar a junta militar que tinha o poder, e mais recentemente com a implementação da Frente Nacional para a Defesa da Constituição (FNDC), movimento à origem de uma onda de protestos organizados em Outubro de 2019 contra as pretenções do presidente Alpha Condé a um terceiro mandato. No Magrebe, a Revolução na Tunísia em 2011 viu movimentos de jovens politizados agir em conjunto com sindicatos de trabalhadores chamando à greve geral. Umas trocas com os movimentos observados nos países da África de Loeste (inclusivo o Senegal ou o Burkina Faso) ou do Norte (como a Argélia) poderiam dar umas chaves aos atores do tecido associativo mauritano. Obviamente, tais exemplos podem constituir inspirações, embora não podem ser pensados como « modelos a seguir » pois cada país tem as suas especificidades sociais, culturais e políticas.

Claro, a competição das associações, pelo prismo da ajuda pública ao desenvolvimento, tem efeitos desastrosos sobre a cultura ativista. Perpetuando uma lógica de « recuperação », de « convergência », em relação aos modelos ocidentais, e estabelecendo as prioridades temáticas do tecido associativo, num país onde faltam as outras fontes de financiemento, a ccoperação internacional (Norte-Sul) tem uma influência tóxica sobre a sociedade civil: ela cria hábitos em relação às indemnizações, salários e perdiem; ela promove um certo vocabulário e uma certa leitura dos problemas (Frente ao fiasco da ajuda pública ao desenvolvimento, para quando a sua desprogramação?). Fazendo isso, ela afasta qualquer possibilidade para a maioria dos atores locais de questionar o conceito de « desenvolvimento » (por trás do qual achamos a ideia de « convergência », de « recuperação » em relação à Europa), e ela reduz as margens de manobra dos inteletuais que desejariam repensar a organização política e social fora da influência inteletual do Ocidento, pois ela mobiliza as energias sobre projetos e programos de desenvolvimento que constituiem toda uma economia, com empregos, carreiras, etc. O próprio perfil das organizações de tipo associativo, importado do direito civil francês, mereceria talvez ser repensado.

Pode-se apostar que novas formas de organizações, de estruturas, de colaborações podem ser imaginadas. A posição dos rappers notavelmente é muito particular na Mauritânia: são uns dos únicos atores capazes de mobilizar os jovens de maneira importante, e de diferentes comunidades (sem ter que os pagar, como alguns partidos políticos). Isso, denunciando ao mesmo tempo abertamento e sem desvio o regime militar, o sistema tribal, o racismo institucional e as desigualdades sociais. Aliás, as associações de rappers ou de hip-hopers, como a Casa das Culturas Urbanas no município de Arafat ou a equipe do Assalam Alekoum Festival à iniciativa do Chitaari Rappé (um jornal de informações assumido por rappers e transmitido no YouTube), têm um sucesso bastante grande nos bairros e uma notoriedade apreciável. Poderia-se imaginar mais estratégias de ação e de advocacia que permitiriam fazer trabalhar juntos os ativistas sinceros dos direitos humanos e, por exemplo, os artistas-rappers. Tal como clubes de literatura ou culturais existem em uns bairros ou aldeias, ativos muitas vezes numa discreção admirável, e que poderiam constituir estafetas originais de mobilização. Foi possível observar tais colaborações no passado, mas muito pontualmente. A associação RIM Youth Climate Movement por exemplo já teve recurso a artistas-rappers para uma sensibilização sobre o assunto do meio ambiente e da mudança climática. Mas a iniciativa permaneceu limitada a uma temática (a mudança climática) que suscita mais a indiferença da maioria da população, e não inscreve-se num questionamento profundo dos paradigmas económicos e sociais observados na Mauritânia – o qual ameaçaria os interesses do poder – ou de um pensamento desenvolvimentalista.

Contudo, observa-se dinámicas positivas levadas por jovens ao nível local, com um ativismo associativo e cidadãos envolvidos em ações voluntárias em favor da coletividade: aulas de apoio escolar, atividades e clubes culturais e desportivos, ações de saneamento nos bairros, etc. Certamente, eles conhecem fraquezas tal como os mais idosos: a fragmentação e a clivagem do tecido associativo, uma falta de trocas de boas práticas e de ajuda, uma liderança perdida em vários pontos que vêem-se como concorrentes, uma falta de estratégia de ação e de comunicação, a insuficiência dos recursos técnicos, materiais e financeiras, etc. Mas a dinámica é bem real, e muitos jovens ativos participam com sinceridade. Mesmo sem reconhecimento das autoridades, associações de jovens organizam-se e constroiem a sua legitimidade ao pé dos habitantes com base das suas ações concretas, confirmando ao mesmo tempo um sentido real das responsabilidades, e uma forte motivação e capacidade a enfrentar as dificuldades. São esses jovens, com as suas qualidades e as suas lacunes, que representem a esperança de uma mudança concreta no país no longo prazo. Eles é que permitem de permanecer optimisto para os tempos futuros. Existe umas estruturas, em setores particulares, que existem e que tentam compensar com mais ou menos eficiência as deficiências dos poderes públicos (A inovação será reservada aos países do Norte? O contra-exemplo da Mauritânia). Mas de forma geral, cada tipo de ator da sociedade parece limitar-se ao seu setor. IGualmente, o diálogo dos movimentos políticos ou ativistas com os sindicatos de trabalhadores é mais ou menos nulo e inexistente. Alguns, primeiramente a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGTM) que tinha apoiada a greve da Sociedade Nacional Industrial e Mineira (SNIM) no primeiro trimestro de 2015, no entanto desmostraram uma verdadeira capacidade a destabilizar o poder em setores chaves da economia; e os direitos dos trabalhadores poderiam constituir uma ferramenta potencialmente interessante em favor de um questionamento do sistema social.

As pessoas que pretendem fazer parte da sociedade civil, trabalhando primeiro e antes de tudo à promoção da sua própria estrutura da sua pessoa e dos seus interesses próprios, deveriam lembrar-se esta explicação edificante de Giovanni Falcone, juiz italiano assassinado em 1992 e envolvido na luta contra o crime organizado: « A máfia é uma organização de socorro mútuo que age aos custos da sociedade civil e para a vantagem dos seus únicos membros » (cmencionado por Marie-Anne Matard-Bonucci em História da máfia, publicado em 1994). A Mauritânia não precisa de novas máfias, mas de ativistas envolvidos e sinceros para inventar um futuro respeitoso das suas identidades, da sua biodiversidade e da dignidade dos seus habitantes. Ela precisa, como qualquer país, de uma visão partilhada a cerca da noção de bens comuns – comuns a todas e a todos.

*   *   *

Este artigo é dedicado a Abdoulaye Doudou Sarr, cidadão incansável e atento, falecido em 24 de Dezembro de 2020. Ele apostava de maneira ousada nos jovens ativistas e nas associações de jovens como vetores de transformação da sociedade. Contudo, ele sempre mostrava uma plena consciência dos escolhos do tecido associativo mauritano, e nunca hesitou em criticar os atores com franqueza. Paz à sua alma.

Partager cet article
Repost0
Pour être informé des derniers articles, inscrivez vous :
Commenter cet article