A exploração do meio ambiente: ou como Moçambique está perdendo suas riquezas naturais
Maputo, visto desde Catembe. Uma ponte construido atualmente deve em breve permitir uma melhora ligação entre Catembe e a capital moçambicana. Tal projeto (assumido por construtores chineses para um custo de 725 milhões de dólares) vai impactar de maneira determinante o futuro de Catembe e mais geralmente do distrito de Matutuine, das suas comunidades e do seu ecosistemo.
No contexto de crescimento econômico e de lançamento de mega-projetos que conhece o Moçambique desde uma década, quais são os impactos deste modelo de desenvolvimento sobre os recursos naturais, o meio ambiente e a organização dos territórios e dos seres humanos? Elementos de explicações.
Sem tirar à questão social a sua dimensão prioritária, aparece claramente que a ameaça que o crescimento econômico moçambicano representa sobre os meios naturais é não somente catastrófica, como também ela impacta também as comunidades em contacto com esses mesmos meios. A desflorestação é uma das piores consequências que conhece atualmente o Moçambique, especialmente por causa do trafic ilegal. De fato, a madeira moçambicana é de exelente qualidade e barato. A sua exploração provoca a lenta mas constante destruição de imensas zonas florestais nas províncias do centro e do norte do país, em particular as de Sofala, de Zambézia e de Cabo Delgado. A exploração de madeira é prospera lá, fora de qualquer controla e com âmbito uma corrupção considerável, com primeiro beneficiário: a China.
Em 2006, o Fórum das Organizações Não-Governamentais da província da Zambézia (FONGZA) publicou um relatório cujo título, explícito, foi reutilizado pela imprensa nacional: « Um take away chinês ! ». Em 2008 ainda, três associações de defesa do meio ambiente denunciaram a desaparição progressiva das florestas da Zambézia. Segundo o inventário Florestal Nacional, 0,58% do património florestal de Moçambique, ou seja: 219.000 hectares, desaparece cada ano. Em Julho de 2011, o jornal Savana publicava uma longa pesquisa sobre o tráfego de madeira em Mocuba, localidade da província de Zambézia.
Corroborando estas investigações, a Universidade Eduardo Mondlane acabou este ano um relatório, financiado pela União europeia, que estima que o trafic de madeira aumentou de 88% entre 2007 e 2011. Não só as autoridades moçambicanas não quiseram ou não foram capazes de fornecer as informações pedidas para a realização deste estudo, como também elas também tentaram tudo para que, uma vez publicado, ele não fizesse barulho. Pois a quantidade de madeira ultrapassa claramente os quotas oficiais. Os dois terços, talvez até os três quartos das exportações seriam feitas de maneira ilegal. E um nível sobre-elevado de quotas são autorizados ás empresas florestais, o que representa uma falta fiscal enorme, que pode atingir 10 ou 11 milhões de dollars (segundo esse estudo); a este valor deve-se acrescentar 10 milhões de dollars de perca a mais, porque as exportações legais são sistematicamente subestimadas, no objectivo de favorecer os exportadores ao nível fiscal.
De novo em 2012, um relatório publicado pelo Centro para a pesquisa florestal internacional (CIFOR) sublinhou o fato que, para 30 milhões de dólares de exportação de madeira registrada em 2009 pela alfândega moçambicana com destino a China, as estatísticas chinesas de 2010 notaram uma importação de madeira moçambicana equivalente a 134 milhões de dólares. « Se as estatísticas chinesas são certas, podemos ler no tal relatório, a diferença é atribuível a deficiências dos controlos aduaneiros, o que significa que Moçambique subiu uma perca considerável em termos de benefícios fiscais. » Muito mais recentemente: dados da ONU Comtrade, compilados pelo World Resources Institute, mostram uma discrepância de 300 milhões de dólares entre o valor de madeira que é declarado para exportação de Moçambique (100 milhões de dólares) e a que, de fato, entra na China (400 milhões de dólares). Esta diferença está crescendo (a madeira moçambicana entrando na Chine ainda era inferior a 90 milhões de dólares em 2009), mostrando a ineficácia dos controlos aplicados nos últimos anos contra o abate e comércio ilegal de madeira – aliás, o valor da madeira moçambicana entrando na China quase duplicou de 2013 a 2014.
Um outro estudo, realizado desta vez pela Agência Britânica de investigação, e publicada hà apenas um ano, revelava que 93% da exportação de madeira moçambicana em direção da China era efetuada ilegalmente. A exportação ilegal de madeira fez perder desde 2007 uns 108 milhões de euros de taxas ao Estado moçambicano, acrescenta a Agência britânica, que supõe que esta atividade criminal é aproveitado por responsáveis importantes do governo moçambicano. De fato, as taxas da exploração agroflorestal não são reafetadas às populações locais. Um vasto sistema caracterizado pela corrupção a todos os níveis (moradores, alfândega, serviços administrativos, etc.) estabeleceu-se – o trafic de madeira é um dos mais importantes do mundo – e ameaça claramente o ecosistema moçambicano. « O sistema funciona assim, conta a jornalista italiana Paola Rolleta, em Maio de 2013: Os traficantes estabelecem um contacto com as autoridades locais. Logo que eles obtêm um sinal positivo para explorar a floresta, eles recrutam pisteiros para achar espécies de valor. Eles recrutam depois pessoas da zona, chamadas pingo pingo, que cortam as árvores, e encham os caminhões. Para poder exportar a madeira, eles têm a seguir que obter a autorização de três instituições: a alfândega, os serviços provinciais das florestas e da fauna e as direções da industria e do comércio das províncias em questão. Os que cumpram não têm as mãos sujas então, eles ficam escondidos e esperam nas cidades portuárias. »
Segundo uma pesquisa publicada em 2013 do Environmental Investigation Agency, até altos responsáveis foram ou estão implicados no trafic de madeira, incluídos ministros da Agricultura. O ultimo ministro da presidência Guebuza, José Pacheco, era acusado de deter participações numa sociedade florestal privada, criada na altura da sua nominação no ministério. De várias maneiras, por atos de corrupção ou por conflitos de interesses enormes, os ministros e mais geralmente os membros da Frelimo participam (e isto foi a característica primeira da presidência Guebuza) á exploração excessiva dos recursos deste país e á confiscação, por formas pseudo-legais diversas, das riquezas criadas. Para ir mais longe sobre este assunto: Moçambique: a hegemonia da Frelimo, um freio à redistribuição das riquezas
É preciso entender que uma melhoria nos controlos da exploração de madeira não se fará pela uma boa-vontade da China: os parceiros chineses não são amigos de Moçambique, eles têm interesses e não se importam da sustentabilidade do modelo econômico moçambicano, aliás, eles aproveitam as fraquezas do sistema moçambicano para melhor o explorar, com custos reduzidos. E isso vale para Moçambique como para toda a África. Em Março de 2013, o governador do Banco central do Nigeria declarou, no Financial Times, na véspera da primeira visita do presidente Xi Jiping no continente africano, que a China « é capaz das mesmas práticas de exploração que as antigas potências coloniais ». No seu livro Moçambique na rota da China. Uma oportunidade para o desenvolvimento? (2010) o economista moçambicano Sergio Chichava: « A convergência de interesses entre uma parte da elite moçambicana e as empresas chinesas impede o estabelecimento de relações saudáveis e sustentáveis entre os dois países. A economia e o meio ambiente de Moçambique são as primeiras vitimas deste fenômeno. Esta convergência acentua os riscos ligados à exportação de matérias-primas brutas, que dependem das flutuações do mercado chinês. São relações similares a aquelas que tinham existidas entre África e o Ocidente: elas limitam as perspectivas de desenvolvimento do continente africano. »
Os tráfegos são em aumento em todo o país, e a evolução política e econômica atual não deixa a pensar que a tendência futura é uma redução. Além da madeira, o trafic de marfim é um dos problemas maiores da natureza moçambicana. « A ultima contagem realizada em Moçambique mostra uma queda dramática de 48% do número de elefantes estes cinco últimos anos, passando de 20.000 a 10.300 indivíduos, declarava a organização norte-americana Wildlife Conservation Society, em 26 de Maio de 2015. Esta queda é provocada pela caça furtiva excessiva cujo objectivo são as populações de elefantes as mais importantes. » A organização norte-americana, que realizou este inventário por avião numa amostra de 10% do território, explica também que 95% dos elefantes matados foram identificados no norte de Moçambique, perto da fronteira da Tanzania, e então foram matados por caçadores tanzanianos.
O Moçambique continua assim tranquilamente neste via dramática, repetindo erros que jà foram observados em países com perfil similar. A História repete-se, e a classe política moçambicana não tirou lição dos exemplos passados. A péssima gestão do crescimento urbano e demográfico é ilustrativo da incompetência das autoridades públicas em termos de planejamento do território, pois a planificação do território é ou quase inexistente, ou muito mal pensado, quand ela não obedece simplesmente a práticas de nepotismo e de confiscação, beneficiando aos dirigentes políticos e econômicos. Ela é uma realidade também em meios rurais. Para ir mais longe sobre as vítimas dos projetos de agricultura intensiva: Agricultura intensiva: em Moçambique, quem são as vítimas colaterais do « progresso »?
É obviamente complicado colocar como prioridade da agenda política a preservação das florestas e dos elefantes, num país onde as necessidades são tão grandes. No entanto, é preciso ter na mente duas coisas: em primeiro lugar, o fato de não assegurar uma boa preservação dos meios ambientes não impede a classe política moçambicana de ser incapaz de responder às necessidades do povo (aliás, várias vezes, a degradação do meio ambiente traduz-se por uma degradação das condições de vida das comunidades); e em segundo lugar, é preciso sair da lógica meio ambiente versus seres humanos, pois um desenvolvimento sustentável deve ser pensando no longo termo e em coerência tanto com a preservação (ou até a valorização) do meio ambiente como também com a melhoria das condições de vida das populações.
É para ter uma visão de longo termo que são supostos ser eleitos os responsáveis políticos: além da realidade da corrupção, eles devem pensar o desenvolvimento além de projetos de exploração ou de exportação intensivos, mas sim na perspectiva da sustentabilidade econômica e social dos processos de criação de riqueza. Contudo, o Fundo monetário internacional (FMI) considera que, daqui a década 2020, o PIB de Moçambique virá a ser levada pelo gás natural; por lembrança, em 2010, Moçambique encontrou 180 trilhões de metros cúbicos de gás na bacia do rio Rovuma, na província de Cabo Delgado. Ou seja: Moçambique está indo tranquilamente no sentido de uma economia rentista, baseado nos hidrocarbonetos, cujos lucros podem confortar o regime e as suas práticas de confiscações e de exploração abusiva. Enfim, em Moçambique, estamos muito longe de ter uma classe dirigente à altura dos desafios que apresentam-se ao país.