Relações Norte-Sul: quando a colapsologia questiona uma leitura desatualizada
Quase seis anos após o Acordo de Paris negociado durante a 21° Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP 21, do inglês Conference of the Parties) de Dezembro de 2015, o mundo parece estar parado na sua luta contra a mudança climática, e ainda mais o combate contra a degradação dos ecossistemas. Donald Trump, até recentemente presidente dos Estados-Unidos, logo a seguir da tomada de posse em Janeiro de 2017, retirou-se do acordo; de fato, Jair Bolsonaro, presidente do Brasil, não o aplica. Na União europeia, os Estados são divididos nas medidas a implementar e não conseguem concordar num aumento dos objetivos que foram definidos anterioremente sobre o clima. Nos últimos anos, a atualidade sobre o Brexit, sobre o Médio Oriente e sobre a guerra comercial entre Pequim e Washington deixou o assunto ambiental por trás – embora a presidente da Comissão europeia Ursula von der Leyen tem prometido, antes da sua tomada de posse em Novembro de 2019, un Green Deal, ou seja, um plano de investimento de 1 000 bilhões de euros para fazer da Europa o « primeiro continento neutro » en carbono em 2050.
Parece cada vez mais óbvio que será perto do desastre que os dirigentes pelo mundo (e os povos que eles dirigem) assumirão o grau de urgência da situação. As consequências não serão as que pensamos – embora problemas sanitários ligados à poluição do ar, dos solos e da água já são observados. A sobre-exploração dos recursos e as perturbações climáticas provocam uma multiplicação das crises, talvez amanhã formas diversas de colapso de certas sociedades, e então uma aceleração dos fluxos migratórias, com movimentos humanos indo em maioria desde as áreas as mais vulneráveis até os espaços de concentração de riquezas. A subida dos perigos deve nos obrigar a agir, coletivamente, antes que seja tarde demais. Pensar um modelo sustentável supõe repensar todo o sistema econômica e social, desde os câmbios comerciais internacionais, até os modos de vida. O que supõe em particular questionar a ilusão segundo a qual as relações assimétricas ligando países ricos e países pobres, povos « consumidores » e povos explorados, seria a garantia da « prosperidade » ocidental no curto prazo.
Em várias ocasões cada ano, nas últimas décadas, temos a oportunidade de assistir à publicação de vários estudos ou relatórios fazendo o balanço da perca dramática da biodiversidade pelo mundo. Assim, o colapso das espécies animais e vegetais e a rarefacção dos recursos confirmam-se com o tempo. Podemos mencionar uns exemplos recentes particularmente ilustrativos. Fora dos bem conhecidos relatórios (regulares) do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), um dos exemplos mais recentes é um relatório das Nações Unidas sobre a biodoversidade, publicado em 6 de Maio de 2019 e produzido em três anos pela Plataforma intergovernamental sobre a Biodiversidade e os Serviços Ecossistémicos (IPBES); esse relatório apresenta uma realidade dramática sobre o ritmo de extincção das espécies. Como sobre o clima, o IPBES chama aqui os dirigentes internacionais a apropriar-se rapidamente a medida do problema. Outro exemplo: em 31 de Outubro de 2019 ainda, a revista britânica Nature, a mais prestigiosa das revistas científicas, publicou os resultados de um estudo talvez o mais detalhado conduzido até então sobre o declínio dos insetos (e dos artrópodes em geral), conduzido por uns vinte pesquisadores pertencendo a umas dez instituições científicas de Alemanha, Suíça e Áustria. Os mesmos analisaram a evolução das capturas de artrópodes sobre 300 sítios (em prado ou em floresta) de três regiões alemãs, entre 2008 e 2017, ou seja, um milhão de indivíduos capturados durante a última década, recenseados em umas 2 700 espécies. Mostraram assim que a queda em curso das populações de invertebrados terrestres é mais rápida do que o previsto pelas estimações publicadas até então, uma realidade ilustrada em particular pelo fato que a biomassa de artrópodes conheceu uma queda de 67% na última década.
Outro caso, que vem ilustrar os riscos existentes para o continente africano: quase um terça da flora tropital africana é ameaçada de extinção, segundo um estudo publicado em 20 de Novembro de 2019 pela revista Science Advances, o qual fornece a primeira avaliação realizada à escala continental nesse assunto. Com base uma técnica baptizado PACA (para « avialiações preliminares automatizadas de conservação ), a superposição dos mapas de distribuição das espécies e as do uso das terras (das mais preservadas às mais exploradas) realizados a partir de amplas bases de dados, permitiu sair resultados sobre 22 000 espécies de plantas, e confirma que a África tropical enfrenta pressões crescentes ligadas à exploração das florestas, às necessidades energéticas, ao desenvolvimento da agricultura e às atividades mineiras, que acrescentam-se ao desregulamento climático e ao crescimento demográfico. A África de Loeste, o centro da Tanzânia, a Etiópia e o sul da República democrática do Congo são identificadas como as regiões onde exercem-se as mais fortes pressões sobre a biodiversidade, com riscos de extinção podendo ultrapassar 76% nas montanhas etiópes e 67% no delta interior do Níger – por lembrança, o estudo não tratava de certos países como Angola e a República centraficana, para os quais os botânicos não dispõem de dados. Também, as áreas de forte concentração humana (em particular a área costeira desde o Golfo de Guiné até o Senegal), onde o desaparecimento das florestas foi considerável nas últimas décadas, aparecem assim como as regiões mais vulnerávais. Essas observações todas aumentam os riscos, no futuro, de um crescimento e de uma multiplicação dos fluxos de populações, em consequência dos desastres ambientais em curso.
Último exemplo: um grande estudo publicado em 28 de Julho de 2020, o primeiro deste nível a interessar-se de forma tão completa ao estatuto dos peixes migradoras, constatou que a população de peixes migradoras tinha conhecido um colapso desde a década de 1970. Foi realizado por quinze organizações, entre as quais a World Fish Migration Foundation, a União internacional para a conservação da natureza (IUCN), World Wildlife Fund (WWF) e a Sociedade zoológica de Londres (ZSL). No detalho, a queda foi de 76% entre 1970 e 2016, para as espécies que evoluem das águas doces às águas salgadas (e vice-versa), ou seja, um declínio de 3% por ano; e, claro, esta realidade é de facto amplamente explicada pela atividade humana. O constato é ainda mais alarmante porque a falta de dados em algumas regiões (em particular em alguns lugares de África, Ásia, América do Sul e Oceânia), induz uma sub-estimação do verdadeiro declínio das populações de peixes migradoras. De fato, estes tipos de peixes são afectados pelas ameaças encontradas tanto em água doce e em ambiente marinho. A degradação, a alteração e a perca de habitat natural representam mais ou menos a metade das ameaças sobre os peixes migradoras, e a sobreexploração um terço – por lembrança, são produzidos cada ano quase 180 milhões de toneladas de peixes. A conseqüência desta situação, globalmente, é dramática para as próprias espécies, como também para os ambientes onde elas vivem (e as espécies que dependem ou convivem com estes peixes), mas é também trágica para as populações humanas que dependem totalmente da pescaria. Completando este estudo de Julho de 2020, no mesmo ano, foi ainda publicado um relatório chamado « Planeta vivo », publicado por WWF em 10 de Setembro de 2020, que fez conhecer que as populações mundiais de vertebrados – aves, peixes, mamíferos, anfíbios e répteis – declinaram em média de 68% em menos de cinquenta anos, entre 1970 e 2016; calculado pela Sociedade Zoológica de Londres, o Índice Planeta Vivo (IPV) é o que permitiu tomar em conta essa realidade, com base dados científicos sobre 20 811 populações representando 4 392 espécies de animais. por lembrança, os vertebrados representam menos de 5% das espécies animais conhecidas, mas são as mais estudadas e melhor seguidas.
Imagem do filme americano O planeta dos macacos (1968). O não-dito do desenlace, que difere do livre homônimo publicado emn 1963, sugere um fim do mundo apocalíptico.
Desde um certo tempo, foram os « teóricos do colapso » que se espalharam nas mídias ocidentais e nas livrarias para descrever as formas diversas que podia ou iria a tomar o « fim do mundo », em particular o fim do mundo industrial. A colapsologia tornou-se um terreno de estudos em si. Na França, um dos mais famosos nessa área temática é o engenheiro agrônomo (e pesquisador) Pablo Servigne, o qual escreveu com Raphaël Stevens um ensaio chamado Como tudo pode desmoronar – Pequeno manual de colapsologia a ser usado pelas gerações atuais (publicado em 2015). Os dois autores definem o conceito como um « exercício transdisciplinar de estudo do colapso da civilização industrial e do que poderia suceder-lhe, baseando-se na razão, a intuição e os trabalhos científicos reconhecidos ». Baseando-se no constato de colapsos que já acontecerem ou que são atualmente em processo, com o desaparecimento ou o declínio de populações de insetos, de aves, etc., mas também crises econômicas, a rarefacção dos recursos, eles fazem converger os « colapsos » para formular a hipotese de um colapso sistémico iminente.
Num sentido mais ampla, o colapso já afectou outras civilizações no passado, incluindo sociedades que não eram de tipo industrial. Logo em 2005, o biólogo e geógrafo norte-amricano Jared Diamond descreveu, no seu ensaio Colapso – Como as sociedades decidem do seu desaparecimento ou da sua sobrevivência, com base muitos exemplos passados ou contemporâneos (Maias, Pascuanos, Anasazis...), os cinco principais fatores que ele tem identificado, podendo conduzir a uma situação de colapso: a degradação do ambiente, a mudança climática, a presença de vizinhos hostis, a perda de parceiros comerciais decisivos, e a capacidade (ou a incapacidade) da sociedade em responder aos seus problemas ambientais. Esses critérios podem cumular-se, e agravar-se mutualmente. O primeiro, a sobre-exploração dos recursos, pode ser claramente favorecida por uma demografia em expansão, e colocar a sociedade em perigo, limitando a sua resiliência em caso de mudança climática brutal. Além disso, quando as sociedades encontram-se isoladas geograficamente, como na ilha de Páscoa, no arquipélago polinésio de Pitcairn, ou ainda como foi o caso dos Vikings noruegueses instalados na Groenlândia a partir do século X, o colapso traduz-se por um desaparecimento total ou quase da população em questão.
Hoje em dia, observa-se ao mesmo tempo, quase em todo o planeta, uma sobre-exploração dos recursos – acentuada pela ganância dos investidores capitalistas e pelo crescimento demográfico mundial – e perturbações climáticas, favorecidas pelas atividades humanas. Se há « colapso », não será em todos os lugares, ao mesmo tempo e da mesma forma. Para muitas ilhas do Pacífico ou do oceano Índico, resultará numa subida das águas e, potencialmente, num desaparecimento do território do mapa; numa aceleração das perturbações climáticas destrutivos, como furacões e outros ciclones; ou ainda a destruição do ecossistema marinho (e portanto dos recursos locais) por consequência de fenômenos como El Niño, ou por causa da poluição e da acumulação de resíduos plásticos. Na China, poderá traduzir-se por repetidas crises sanitárias – a decisão de Pequim de proibir gradualmente, em 2018 em 2019, a importação de resíduos vindos do Ocidente (sucata de aço inoxidável, madeira, autopeças, produtos plásticos, papeis e têxteis, etc.), ilustra provavelmente uma forma de conscientização do governo chinês sobre a situação ambiental do país, até então considerado como a « lixeira do Ocidente ».
Nas áreas onde as tensões intercomunitárias já são fortes, como no Médio Oriente, a luta pelo acesso aos recursos (a água e as terras aráveis em particular) já começou e pode resultar numa multiplicação dos conflitos, e portanto dos massacres. Na América do Sul, o maior país do continento, as tensões sobre os recursos e os excessos do desmatamento terão consequências de longo termo; após treze anos de governo PT que permitiram uma relativa desaceleração do fenômeno, a sobre-exploração da floresta Amazônica voltou a ser muito atual, na presidência Temer (2016-2018) e ainda mais com Jair Bolsonaro, como o tínhamos analisado apenas seis meses após a sua tomada de posse de Janeiro de 2019 (Presidência Bolsonaro: no Brasil, as comunidades indígenas no impasse). Por lembrança, segundo dados atualizados em Novembro de 2019 pelo Instituto nacional de pesquisas espaciais (INPE), o desmatamento na Amazônia brasileira ultrapassou, entre Agosto de 2018 e Julho de 2019, os 10 000 km² pela primeira vez desde 2008 (quando a área desarborizada tinha sido de 12 287 km² em doze meses), ou seja, um aumento de 43% em relação aos doze meses anteriores (a desflorestação tinha sido de 7 033 km² entre Agosto de 2017 e Julho de 2018); esses dados relevam uma progressão ainda maiora (74,5%) do desmatamento nos territórios indígenos, sobre um ano, com 423,3 km² desarborizados lá. O Estado nordestino do Pará é que era então o mais afectado. Finalmente, só no primeiro ano de presidência Bolsonaro, a deflorestação na Amazônia brasileira mais que duplicou, atingindo uma área de mais de 8 970 km² no total do ano de 2019 (contra uns 4 878 km² em 2018). As consequências a longo prazo não serão só vividas pelos Índios ou pelos Nordestinos, mas sim por todo o Brasil, pois a Amazónia tem um papel determinante no meio ambiente regional, em particular na regulação do clima sub-continental. De uma certa forma, o céu preto, visualmente apocalíptico, que apareceu aos habitantes de São Paulo em pleno dia, em 19 de Agosto de 2019, resultado de um fenômeno meteorológico (presença de particulas húmidas e de uma frente fria vinda da costa) acentuado pelos incêncios florestais consideráveis que afectavam então a Bolívia e o Paraguai vizinhos como o próprio Brasil, pode ser interpretado, simbolicamente, como um aviso à população. Um aviso vão.
Outro exemplo, na Austrália, país-continento onde os ecossistemas são particularmente frágeis, os desastres ambientais multiplicaram-se nos últimos anos, como se a natureza quizesse lembra,r aos que permanecem surdos e cegos, a insustentabilidade do modelo econômico e do modo de vida dos Australianos. Entre outras coisas, ameaças terríveis permanecem sobre a Grande Barreira de Corais, em particular o branqueamento dos corais (um fenômeno de declínio que traduz-se por uma descoloração e, se é prolongado, por a morte dos corais), observado desde 2016 num contexto de aumento das temperaturas das águas; ainda, o nordeste do país (Estado de Queensland) é regularmente afetado, como o foi no verão austral de 2018-2019, por chuvas torrenciais e inundações excepcionais, cujos sedimentos afectam (« sufocam », se diz) a Grande Barreira de Corais. Ao lado desses fenômenos, só em Janeiro de 2019, centenas de milhares de peixes foram achados mortos no Estado de Nova-Gales do Sul, consequência de secas terríveis que conheceu o sudoeste da Austrália (e provavelmente também da poluição); na mesma altura, na Tasmânia, incêndios gigantescos devastaram mais de 74 000 hectares de florestas em uma semana. De novo na Austrália, em Novembro de 2019, a parte Leste da Austrália conhece os seus maiores incêndios desde 40 anos, provocados pela ausência de precipitações e por temperaturas muito elevadas ultrapassado 35°C; destruirem um milhão de hectares de mata e arbutos nos Estados de Queensland e Nova-Gales do Sul, ameaçando a periferia de Sydney. Em Dezembro de 2019, uns cem desses mesmos incêndios, bem longe de acabar (com até temperaturas além dos 40°C), juntarem-se, formando, a umas dezenas de km ao norte de Sydney, uma área de 250 000 hectares de um « megafogo » muito preocupante. Ai também, a cerca do 10 de Dezembro, a parte Leste do país ficou recoberto de um nevoeiro de fumos tóxicos vindos dos incêndios nas matas, deixando em particular Sydney em condições de alerta críticas – com a activação alarmante dos detectores de fumaça, linhas de transporte fechadas, alunos obrigados a ficar trancados nas escolas durante os tempos de recreação, etc.
« É um problema que se coloca ao planeta, mas é um problema que todos os países do mundo vão enfrentar de forma diferente, e com recursos diferentes, explicou o historiador e antropólogo francês Emmanuel Todd, numa entrevista de Novembro de 2018 no canal Internet francês chamado Thinkerview. Nos países já muito quentes, iremos a catástrofes sem nome. Mas o problema, é que a humanidade é fragmentada, e reagirá de forma fragmentada. Portanto se você faz cenários catástrofes – e aliás é por isso que permanece tão difícil achar respostas –, a catástrofe não será a mesma para todos. E portanto os grupos humanos, diferentes, serão afectados de forma diferente. Isso será absolutamente nojento, mas nos dá pelo menos a certeza que a humanidade sobreviverá. » O entrevistador acrescenta a isso: « Ou talvez que os piores sobreviverão. » Num contexto de sociedades cada vez mais interconectadas, é improvável que os povos « desapareçam » completamente e simplesmente. Num mundo cada vez mais aberto, as populações vão mover-se cada vez mais – elas já fazem isso. Para a sobrevivência. As áreas em tensão, onde cumulam-se crescimento demográfico, má gestão dos recursos locais e perturbações climáticas, serão as mais afectadas pelas partidas. Podemos lembrar aqui estatísticas poucas famosas, estabelecidas pelo secretariado executivo da Convenção da ONU pela luta contra a desertificação: a degradação dos solos, e em particular o fenômeno de desertificação acentuado pela sobre-exploração dos recursos e as mudanças climáticas, já afectam dois bilhões de hectares de terras, e três bilhões de pessoas no planeta.
Embora a interconexão comercial permite importar grandes quantidades de bens alimentares, de tal forma que pode-se melhor responder à escassez, a multiplicação e a agravação das crises não permitem ser optimistas em relação ao grau de resiliência das sociedades as mais vulneráveis; mais provávelmente, haverá uma aceleração dos fluxos humanos, já observada desde décadas, ou seja, primeiro em direção das cidades (onde se concentram os serviços básicos e os bens alimentares importados), e mais geralmente em direção das áreas de concentração de riquezas (inclusive nos países do Sul). Contudo, e enquanto a década de 2010 já viu milhões de imigrantes chegar nos Estados-Unidos (podemos nos lembrar, no final de 2018, da marcha de 3 000 Hondurenhos que tentaram passar a fronteira a partir do México) e na Europa (Sírios, Eritreus, Iraquianos, Afegãos...), quem pode imaginar que essa situação – o deslocamento de populações inteiras para a sobrevivência – pode corresponder a uma situação sustentável a longo prazo?
A criação de muros como o tenta desde a sua chegada na presidência norte-americana Donald Trump, na sua fronteira sul, não impedirá eternamente as pessoas de chegar – os guarda-fronteiras de Ceuta e Melilla, presídios espanhois em Marrocos, já sabem bem isso –, não mais do que os acordos que tentam externalizar para regimes autoritários a luta contra os fluxos migratórios, por exemplo a Turquia, a Mauritânia, Marrocos, o Níger, ou ainda os guarda-fronteiras líbios. Abrir as fronteiras sem nenhum controle também não é uma solução – aliás, uma maioria de Europeus não o querem, o que deixa a supor situações de tensão nos países de acolhimento, traduzindo-se por enquanto com o surgimento eleitoral de partidas de extrema-direita. Se as crises multiplicam-se realmente, então os fluxos, cada vez maiores, serão cada vez mais difíceis a enquadrar – as cenas anárquicas de milhares de familhas nas rotas migratórias nos Balkãs, esses seis últimos anos, já ilustram o tipo de caos encontrado, e os dramas humanos por trás –, em todos os níveis (logístico, econômico, social, cultural...). Diante dessa realidade, deveria haver uma conscientalização geral sobre a importância de prevenir as crises nos países de partida.
Prevenir as crises, é portanto entender quais são as causas. E portanto entender que a sobre-exploração dos recursos do Sul, sobre a qual é por grande parte baseada o modo de vida ocidental, não é uma realidade em favor do conforto ocidental, mas pelo contrário contra os interesses de longo prazo dos cidadãos ocidentais (sem falar, além disso, do custo atual para as populações dos países explorados). Pois à final, donde vem a maior parte do petróleo, do gás, dos minerais que alimentam os carros, os aquecedores, e que permitam o funcionamento dos Smartphones, iPhones e outras novas tecnologias usados pelos Europeus, os Norte-Americanos e as classes médias dos países emergentes, a não ser dos continentos localizados ao sul e leste do Mediterrâneo, e ao sul do Rio Grande que separa os Estados-Unidos do México? Essa sobre-exploração supõe, a longo prazo, desregulamentos mundiais que provavelmente afectarão em primeiro plano os Ocidentais, e portanto ameaçarão o seu modo de vida. A urgência, é reconhecer que o crescimento dos fluxos de refugiados pelo mundo é o resultado de uma situação assimétrica entre países do Norte e do Sul que mantem o Terço Mundo numa forma de subdesenvolvimento e conforta lá os disfuncionamentos como a corrupção e o fraco capital educativo. É necessário não teimar em perpeturar um tal sistema de relações internacionais e de câmbios comerciais, certamente muito antigo, mas que nos conduz todos no impasse. Sem reação para mudar o sistema, os Ocidentais (e com eles, as classes médias dos países emergentes, que acedem ao consumo de massa e pretendem aproveitar tanto como o fizeram os Europeus e os Norte-americanos) verão um dia o bumerangue voltar no seu rosto.
Na segunda parte do seu ensaio Colapso (2005), o escritor norte-americano Jared Diamond descreve sociedades do passado que entraram em colapsos. Ele apresenta cinco grupos de fatores para desenvolver a sua argumentação: degradação ambiental, mudança climática, vizinhos hostis, perda de parceiros comerciais, e as respostas trazidas pela sociedade aos seus problemas. Ele dedica um capítulo inteiro aos Maias de América central, que sobre-exploraram os seus recursos, degradaram o seu meio ambiente, sofriram de mudanças climáticas importantes, e combateram entre eles, além de subir os ataques de vizinhos hostis. O colapso da civilização maya demorou muito tempo um mistério, dado o isolamento dos monumentos mayas no coração da selva.
As soluções são globalmente conhecidas, embora são mais fáceis e listar do que a implementar. acabar com as guerras na África e no Médio Oriente, voltar sobre todos os laços comerciais e os contratos de exploração dos recursos ligando os países do Norte e os países do Sul (para um melhor equilíbrio nas relações e um uso razoável dos recursos), apoiar a implementação de sistemas de ajuda pública ao desenvolvimento mais relevantes (e prever a desprogramação da mesma ajuda externa, para respnsabilizar os governos dos países « ajudados »), reconsiderar integralmente os modos de consumo alimentar para moderar os fenômenos de desmatamento cujo alvo é o aumento da produção agrícola mundial (em particular a destinada a alimantar especificamente o gado), iniciar programas ambiciosos de redução do uso de plástico (e de redução dos resíduos em geral), aqui são umas ideias, uns projetos, entre outros, nos quais pode-se avançar. A lista não é exaustiva, e seria necessário descrever com mais detalhes as obras a iniciar, as quais são diversas.
Mudar o modelo não é só da responsabilidade dos dirigentes políticos e econômicos dos países desenvolvidos. As « elites » do Sul são responsáveis, talvez mais ainda porque elas agem muitas vezes, submetendo-se aos interesses dos países dominantes, contra os interesses diretos dos seus próprios cidadãos. Aceitando subornos ou outros favores em troca da obtenção de concursos públicos opacos ou sobre-facturados. Validando a sobre-exploração dos recursos naturais do país que eles governam (terras agrícolas, áreas de pesca, minas de metais raros ou de carvão, fontes de hidrocarbonetos, florestas...). Desempenhando às vezes o papel de intermediário direto na exploração dos trabalhadores locais – os casos de conflitos de interesse entre esfera política e setor têxtil no Bangladesh é um bom exemplo disso. Igualmente, aceitando o princípio de sobre-exploração dos recursos de tal forma que ela seja irreversível para os habitantes (em termos de saúde pública) e para o ecossistema local. São exemplos, entre outros, de como os dirigentes de muitos países do Sul sacrificam o futuro do seu povo, no altar do enriquecimento pessoal, ou, quem sabe, talvez em nome de uma visão bem incompreensível do progresso econômico.
A classe política (e econômica) ocidental tem uma influência forte na escolha do pessoal político que dirige esses países – no que tem a ver com a França, isso vale pelo menos para a África francófona. Se Paris é capaz de colocar os seus pões, de apoiar golpes, ou pelo menos de validar a chegada no poder de tal ou tal chef de Estado africano, então melhor não duvidar do fato que, com um pouco de boa vontade, a diplomacia francesa poderia favorecer a emergência de figuras mais visionárias ou mais honestas. Validar o golpe de Estado de Mohamed Ould Abdel Aziz em 2008 na Mauritânia, sobre pretextos ligados à segurança (num contexto de subida do terrorismo no Sahel mauritano), e deixar os seus próximos desperdiar por mais de dez anos os recursos do países (da pesca e da mineração, principalmente) sem nenhuma reforma notável para valorizar o capital humano e diversificar a economia, isso é simplesmente absurdo. Igual para outros países do Sahel, onde as tensões identitárias acumulam-se. Da mesma maneira, apoiar a tomada de posse de Alassane Ouattara na Costa do Marfim em 2011, na base da sua proximidade com os interesses franceses e a sua preferência pelo modelo de livre-comércio – não quer dizer que, por outro lado, Laurent Gbagbo fosse um génio, mas não é o assunto aqui –, mostra que a diplomacia francesa não questiona muito o modelo de relações « françafricanas » nas quais é baseado a « prosperidade » do modelo econômico da França.
Resultado: o continento africano, o único com o qual a França entretem uma balança comercial excedente, tem que lidar com tensões políticas, sociais e fluxos migratórios cada vez mais importantes. Pelo menos, os Ocidentais devem parar de interferir na vida desses países, para permitir a possibilidade de alternâncias reais. Não quer dizer que líderes visionários acederiam logo e em todos os lugares a cargas de responsabilidade, pois os freios são também locais, muitos e complexos, mas uma barreira determinante desapareceria para deixar a esses povos as chaves do seu destino. Estamos longe disso. O caso do Chade é emblemático. Em 3, 5 e 6 de Fevereiro de 2019, os aviões do exército francês bombardearam, naquele país do Sahel, rebeldes da União das Forças da Resistência (uma aliança de oito grupos de oposição), considerada como terroristas por Ndjamena. A resgatar o autocrata Idriss Déby, no poder desde um golpe de Estado em 1990, Emmanuel Macron mostrou ao mundo inteiro que a França ainda privilegia os seus interesses estratégicos. Mais recentemente, logo após a morte, em condições confusas (durante operações militares), do mesmo Idriss Déby (em 20 de Abril de 2021), a visita do chefe do Estado francês em Ndjamena teve valor de « validação » da tomada de poder do próprio filho do presidente falecido, o general Mahamat Idriss Déby, o qual lidera desde então uma junta militar oficialmente encarregada da transição.
Mais geralmente, o contexto da segurança no Sahel justifica a presença de tropas francesas no Mali, no Níger e no Chade (4 500 soldados no âmbito da operação Barkhane, lançada em 2014 para substituir as operações Serval e Épervier), que esconda mal uma vontade de apropriar-se os recursos locais – lembramos por exemplo que um terço do urânio usado nas usinas nucleares da sociedade francesa Orano (ex-Areva) vem do Níger. Na África de Loeste, muitos são aqueles que denunciam o apoio da França a ditadores, pela preservação dos seus interesses estratégicos, mas também pelo imperativo de estabilidade política e militar. Contudo, na raiz das crises do Sahel, nas quais prosperam os grupos jihadistas ou mafiosos muito poderosos (os mesmos que as tropas francesas combatem lá), há um conflito pela reparticção e o acesso aos recursos (a terra e a água, mas não só). É acentuado por uma demografia descontrolada (mais de 7 crianças por mulher no Níger, 6 no Mali, 5 no Burkina Faso, na Nigéria e no Chade...), a mudança climática, a permanência de antagonismos interétnicos, antigos e exacerbados, ou ainda a porosidade das fronteiras, a qual permite a circulação das armas e os tráfegos.
Claramente, a permanência de um modelo baseado no bem-estar ocidental (o qual já revela muitas limites) e numa relação desequilibrada entre o Ocidente e o resto do mundo, colocando em tensão os recursos, obrigando os indivíduos a deslocar-se pela sobrevivência, não serve os interesses de longo prazo dos próprios ocidentais. E já é profundamente desumana, pois a suposta prosperidade ocidental base-se atualmente na miséria e na exploração de milhões de outras pessoas, no questionamento das condições que poderiam lhes garantir saúde, felicidade e perspetivas. Pois uma partida forçado sempre é um drama em si, para a pessoa que migra, como para os seus próximos. Isso vale ainda se trata-se de milhares ou milhões de indivíduos, e que a partida faz-se sob a ameaça da guerra, como na Líbia, na Síria, no Iêmen, no Iraque, ou ainda no Afganistão.
Prolongar esse modela, não entender que viver melhor e mais tempo, coletivamente, supõe repensar o sistema, em particular em termos de sobriedade, é entrar num impasse. Consiste apenas, como o diz muito bem Jared Diamond, em ter o privilégio de serem os últimos a morrer. E se a Europa quer evitar tornar-se também um território sob tensão em termos de recursos, com uma multiplicação das chegadas descontroladas (cada vez mais importantes) e uma multiplicação das crises que seguiriam, então ela tem que parar colocar sob tensão os recursos em outros lugares, para prevenir as crises que sem dúvida ocorrerão (e que já são observadas lá). Numa perspetiva de grandes mudanças e de novos desequilíbrios demográficos, as crises na própria Europa, entre acolhedores e imigrantes, não deixarão de acontecer.
Tornou-se muito difícil falar sobre imigração. Pois a questão da imigração – e sobretudo do acolhimento (ou das expulsões) – é tratada de forma isolada, num tom ou tenso, ou angélico. As mídias participam alegramente dessa dicotomia absurda, apresentando muitas vezes a clivagem de forma binária, com títulos redutores como « Fronteira: a favor ou contra? » ou « Europa escorredor ou Europa fortaleza ». E muitos partidos, à esquerda como à direita, brincam muito disso, ou para satisfazer um eleitorado supostamente hostil ao acolhimento de migrantes ou claramente xenófobo (por convicção ou por oportunismo), ou para aparecer como defendedor das grandes causas humanitárias (sem medo das contradicções existindo entre o discurso e os atos, entre os valores defendidos e o estilo de vida adoptado, entre os discursos de abertura e as políticas implementadas atrás). E continua-se a desconectar essa temática de muitas outras, contudo relacionadas a ela, em particular a diplomacia em relação à África e ao Oriente Médio, e a questão da mudança climática e da gestão dos recursos à escala mundial.
Nota-se apenas, na última eleição presidencial francesa, a postura do candidato de esquerda Jean-Luc Mélenchon, líder do movimento La France Insoumise, que tentou analisar o fenômeno de migrações além da única questão do acolhimento, mas também das suas causas. Como aqui, num discurso em Marselha, em 9 de Abril de 2017 : « Não devemos aceitar mais os tratados desiguais que derramam sobre os povos mercadorias adquiridas a mil preços, no trabalho sobre-explorado, e jogadas de tal forma que elas matam qualquer atividade econômica que essa gente teria gostado ter em casa. Temos que acabar com o abandono covarde que obriga os povos do Sul a lidar com a mudança climática – já começada – e que os deixa gerir o 60% dos movimentos de populações que o deserto, o calor extremo, a seca criam lá. E como por um efeito dominó, sucumbido ao peso dessas mercadorias por um lado, da raridade das colheitas por outro lado, [essas populações] vão do campo para as cidades, onde já estão inúmeras massas que por sua vez também colocam-se em movimento, abala as fronteiras, destruindo sem o querer qualquer organização. E é hora, acima de tudo, de acabar com as guerras que devastam esses países. [Essas guerras] que nunca deixaram de ser outra coisa do que uma briga para apropriar-se as matérias primas. »
O problema dos bons sentimentos é que eles pensam-se como uma verdade, e portanto não toleram uma opinião oposta. E os bons sentimentos têm tendência em confundir a descripção e a prescripção. Para o formular de uma outra forma, quando o filósofo francês Raymond Aron, no final dos anos 1950, constata (sem o desejar) que a Argélia será independente, ele é despedido pelo jornal onde trabalha, Le Figaro, o qual entende como uma prescripção o que era, na verdade, apenas uma descripção. Portanto os bons sentimentos julga as pessoas como se o que elas descrevem fosse o que elas desejam. É o início de processos de intenção. Por isso preferimos sublinar que esse artigo não quer ser uma prescripção; ele apenas alerta sobre os riscos ligados aos abusos e aos excessos do modelo econômico, comercial e financeiro atualmente observado no âmbito do capitalismo globalizado, e sobre os freios políticos e intelectuais que impedem o despertar das elites ocidentais, e mais geralmente de todas as classes políticas e econômicas pelo mundo, sobre as realidades presentes e futuras. Esperemos que os inúmeros textos produzidos nos útimos anos, sob a forma de livros, relatórios, fóruns ou artigos, anunciando o colapso das sociedades humanas – após ou com o colapso de muitas outras espécies –, também não serão interpretados como prescripções, mas sim como o que eles são, ou seja, um constato alarmante do impasse no qual estamos todos, coletivamente, engajados. Obviamente, a conscientização chegará um pouco tarde, e no Ocidente, o sistema não será questionado num prazo razoável, pois permanece a ilusão que os seus pilares constituem a garantia do estilo de vida « próspero » dos Ocidentais. Tudo é questão de crença: temos todos os elementos que nos permitem entender o que está acontecendo e o que está por vir, mas não acreditamos realmente nisso. E não vamos acreditar antes de estar realmente no pé do muro.
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Nesse texto tirado do ensaio Colapso (2005), ao capítulo chamado « O mundo é um pôlder », o geógrafo e biologista norte-americano examina assuntos como o capitalismo e a globalização, e tira lições concretas de casos de colapso de civilizações passados. Ele começa assim: « Um problema único exacerba um outro e torna mais difícil achar uma solução. Por exemplo, o crescimento demográfico afecta os [...] outros problemas: mais humanos supõe mais desmatamento, mais produtos tóxicos, mais pedido de peixe selvagem, etc. O problema da energia é ligado a outros, porque o uso de combustíveis fósseis para a nergia contribui de forma pesada aos gás com efeito de estufa; porque combater o declíbio da fertilidade dos solos com fertilizantes sintéticos exige energia para os fabricar; porque a raridade dos combustíveis fósseis torna mais interessante a energia nuclear, a qual coloca o maior problema de « toxicidade » em caso de acidento, e porque a raridade dos combustíveis fósseis torna a longo prazo mais cara a adessalinização da água do mar, solução ao problema da raridade da água doce grande consumidora de energia. O declínio das pescarias e outras fontes de aprovisionamento alimentar selvajem conduz a um aumento do consumo de gado, das culturas e da aquacultura, O declínio das pescarias e outras fontes de aprovisionamento alimentar selvajem conduz a um aumento do consumo de gado, das culturas e da aquacultura, portanto das superfícies cultivadas, portanto ao aumento da eutrofização. Esses mesmos problemas ligados ao desmatamento, à escassez de água e à degradação dos solos no Terço Mundo favorecem as guerras lá e aceleram os movimentos migratórios ilegais procurando asilo no Primeiro Mundo. » Jared Diamond explica depois o seguinte, lembrando logo no início que « a sociedade mundial segue atualmente um caminho não sustentável; cada um dos [...] problemas de não sustentabilidade [...] são bombas-relógios que irão explodir antes de cinqüenta anos ».
Assim, a destruição das florestas tropicais húmidas [em 25 anos] será acabada no mundo, fora talvez de partes das bacias amazónica e do Congo. Com os níveis atuais, reduziremos ou destruiremos a maioria das pescarias marinhas que permanecem no mundo, reduziremos as reservas limpas, barates ou fáceis de acesso, de petróleo e de gás natural, e seremos pertos dos tectos de fotossíntese em algumas décadas. Prevê-se [...] o aquecimento global [...] e [o colapso de] uma fracção significativa das espécies animais e vegetais [...] em um meio século. « Qual é o problema ambiental e demográfico o mais importante hoje? » pergunta-se muitas vezes. Uma resposta rápida seria: « A nossa tendência errada a querer identificar o problema o mais importante! » [...] Temos que os resolver todos.
A descripção da degradação do meio ambiente pelo mundo, tal como foi feita por Jared Diamond em 2006, está abaixo da realidade, pois desde esta data, novas informações chegaram sobre o colapso das espécies animais e vegetais e a rarefacção dos recursos. Já enumeramos certos dos relatórios ou estudos recentos que o ilustram, no início deste artigo.
A seguir, Jared Diamond ainda explica, em terríveis perspetivas (que deveriam alertar as elites ocidentais): « Assim, do próprio fato que seguimos cada vez mais [uma] via não sustentável, os problemas mundiais de ambiente serão resolvidos, de uma forma ou de uma outra, enquanto as nossas crianças viverão. A única questão é saber se a solução será pouco desagradável, porque a teremos escolhida, ou desagradável, porque ela resolverá-se sem que a tenhamos escolhido, pela guerra, o genocídio, a fome, as epidemias e o colapso das sociedades. Tantos fenômenos endémicos na história da humanidade, mas cuja frequência aumenta com a desgradação do ambiente, a pressão demográfica, e com a pobreza e a instabilidade política resultantes. [...] Uma saída que parece menos radical que o colapso, seria a repetição de situações como as do Ruanda e de Haiti em muitos outros países em vias de desenvolvimento. Como imaginar que os habitantes do Primeiro Mundo conservariam o seu conforto, sob a ameaça do terrorismo, das guerras e das doenças, e enquanto crescem os movimentos migratórios a partir do Terço Mundo em vias de colapso? » Ele ainda explica o seguinte.
Os mais ricos do Primeiro Mundo não são preservados dos problemas ambientais. Se podem em geral evitar os problemas ligados aos problemas de qualidade da água, bebendo água em garrafa, não deixam de respirar o mesmo ar e não podem evitar os problemas alimentares. [...] Além disso, uma das conclusões das nossas análises dos reis maias, dos chefes noruegueses da Groenlândia e dos chefes da ilha de Páscoa é que, a longo prazo, os ricos não garantem os seus interesses e os das suas crianças reinando numa sociedade em colapso; apenas compram o privilégio de serem os últimos a morrer pela fome. Quanto à sociedade do Primeiro Mundo, lembramos que o seu consumo [...] não sustentável de recursos representa a maiora parte do consumo mundial total que provoca os impactos [anterioramente] descritos.