Mauritânia: o Sahel Fablab, quando inovação tecnológica rima com inserção dos jovens
O espaço educativo e cultural Os Ecos do Sahel, no qual encontra-se o Sahel Fablab de InnovRim, no bairro de Cité Plage, em Nouakchott.
Em 28 de Novembro passado, a Mauritânia festejou o aniversário da independência do país, proclamado em 1960. Mas esta data é também o aniversário do primeiro fablab mauritano, o Sahel Fablab, em 2014. Inspirado por hackerspace e makerspace norte-americanos, um fablab constitui um espaço de partilha livre, fornecendo ferramentas, máquinas, competências e saberes. Em resumo, um lugar de invenção e de aprendizagem, aberto de todos. No contexto mauritano, o Sahel Fablab, levado pela associação InnovRIM, tem uma ambição: constituir um espaço de inovação, de incubação técnica, de prototipagem e de coworking para as e os que desejam desenvolver sua idéia, na perspectiva de criar emprego e de fortalecer as competências profissionais dos jovens.
Formados em electrónico e em automatismo, geolocalização com a aplicação Open Street Map, recuperação de computadores, reciclagem de velhos pneus transformados em móveis, desenvolvimento de aplicativos móveis e web… Longe das caricaturas sobre o deserto, os camelos e os tradicionais três copos de chá, a experiência mauritana do Sahel Fablab nos leva ao mundo da inovação e do digital, com uma abordagem eco-cidadã.
Já o vimos num artigo de Agosto de 2018 (A inovação será reservada aos países do Norte? O contra-exemplo da Mauritânia), as iniciativas existem, diversas, em Mauritânia, e elas contradizem o mito de uma África parada, imóvel, e de uma juventude que só teria como ambição ir para Europa. O Sahel Fablab é uma delas. Mas antes de tudo, vamos lembrar o que é um fablab, cujo nome é uma contracção do inglês fabrication laboratory, « laboratório de fabricação ». Concretamente, é um lugar aberto ao público, que coloca à disposição vários ferramentas, em particular máquinas-ferramentas controladas por computador, para a concepção e a disposição de objetos. A principal caraterística dos fablabs é sua « abertura »: o lugar tem vocação a ser comunitário, coletivo, e propõe um acesso livre aos indivíduos tanto como um acesso por inscrição no âmbito de programas ou de oficinas específicas. Achamos lá perfis diversos: empreendedores, artistas, reparadores, estudantes, desempregados, hackers, etc., que desejam aprender, partilhar, progredir ou avançar em seu projeto para passar da fase conceitual para a fase de prototipagem, e depois da fase de prototipagem segue a de desenvolvimento, e depois a de implementação e, às vezes, de comercialização.
No espírito do coworking, o fablab também é um lugar de encontro e de criação colaborativo que permite à todos descobrir uma nova área e aprender com os outros – uma lógica próxima dos princípios que norteiam o conceito de educação popular, segundo o qual cada um pode alternativamente ensinar e ser ensinado, sem idade para aprender, e usar os seus saberes como ator social. Também inclui os valores do desenvolvimento sustentável, pois o fablab também costuma ser um lugar de recuperação, de reciclagem, onde se transforma e se repara objetos o dia a dia. Também fabrica-se objetos únicos: objetos decorativos, objetos de substituição, próteses, órteses, ferramentas, etc.
Os fablabs funcionam em rede – a ideia sendo de dinamizar a inventividade, partilhando as experiências e os saberes, e dando acesso a ferramentas de fabricação digital. Na Mauritânia, hoje em dia, só um fablab foi criado, o Sahel Fablab, com especificidades relativas ao contexto económico e social do país.
A experiência do Sahel Fablab: a innovação ao serviço do conhecimento e do emprego
Um tumulto geral reina na sala. Por um lado, os jovens discutem circuitos electrónicos em torno de um protótipo de « casa inteligente » miniatura. Outros falam de um aplicativo sobre a eco-cidadania. Dum outro lado, ovos estão em uma incubadora artificial, equipada de uma lâmpada para mantê-los aquecidos. Fornos solares de papelão, de madeira e de alumínio são armazenados numa prateleira. Um jogo para criança, parecido a um quebra-cabeça chinês, ganha forma graças aos filamentos de plástico da impressora 3D em ação, sob o olhar atento de um estudante em informático. Restos de computadores estão aqui e ali. Jovens estão sentados em móveis feitos com pneus recuperados e pintados de amarelo e verde. Pessoas entram e saem, o movimento é quase constante no Sahel fablab.
Em 28 novembre 2019, essa iniciativa teve cinco anos de idade. Se o lugar está agora equipado de material e de máquinas-ferramentas, e atraia regularmente novos membros, a história não foi sempre tranquila e até pediu uma certa ousadia. Diarra Sylla, presidente da associação InnovRIM e fundadora do Sahel Fablab, nos conta como começou a aventura: « Tive a ideia quando acabei os meus estudos, em Novembro de 2009, no Marrocos. Fui fazer um estágio no Senegal numa estrutura de navegação aérea chamada a ASECNA [Agência de Segurança de Navegação Aérea], em Dakar. […] Eu conheci uma Beninense que fazia lá o estágio dela como técnica em electrónico. Ela disse-me que há um novo lugar que abriu em Dakar, o fablab DefkoAkniep [hospedado pela organização Kër Thiossane], onde há muito material. Assim eu descobri o conceito. Foi emocionante: a impressora 3D que funcionava, a CNC, oficinas sobre os circuitos Arduino…Com ela, nos organizamos cada final de semana para nos encontrar lá. » Engenheira Telecom especializada em informático, hoje com 38 anos de idade, Diarra continua: « Eu estava no Senegal para ganhar experiência e voltar na Mauritânia como empreendedora, com uma ideia de projeto que me permitiria ajudar muitos jovens, especialmente na área da educação. […] Porque a maioria dos jovens reclama da falta de emprego, mas não é só uma questão de emprego: há também uma falta de competências. Eles não têm lugares onde formar-se, onde fazer estágios. Portanto, quando eu vi esse espaço, pensei que era um lugar muito bom, que pode resolver muitos problemas. »
As inovações nas novas tecnologias pode ser ao serviço do desenvolvimento na África, baseando-se numa juventude dinámica e ambiciosa. As TIC ampliam consideravelmente as oportunidades económicas para milhões de pessoas.
Foi a seguir do fórum Innov’Africa, organizado em 2014 em Lomé, no Togo, que, junto com muitos jovens envolvidos nas áreas da inovação e do digital, foi decidida a criação de InnovRIM, a associação que leva o Sahel Fablab. Em 28 de Novembro de 2014, a Mauritânia torna-se assim o décimo-quinto país africano a juntar-se à rede de Imagination for people e dos fablabs africanos francófonos.
No início, o local estava localizado no edifício El Mami, no centro da cidade de Nouakchott, e não tinha computadores. O espaço era bastante inadaptado, e a equipa em fase de composição, mas os membros eram motivados e apaixonados pelas novas tecnologias, muitos deles formados entre o Marrocos, a Mauritânia e o Senegal. Um financiamento da cooperação francesa, em 2015, no âmbito de um consórcio de associações que trabalham nas temáticas ligadas à cultura e à juventude, permitiu a InnovRIM adquirir novos computadores, e sobretudo tornar-se conhecido. O fablab muda-se no mesmo ano, para ir nos muros dos Ecos do Sahel, ou Échos du Sahel em francês, um espaço cultural e educativo localizado no bairro Cité Plage, em Nouakchott.
O estabelecimento do Sahel Fablab queria inicialmente ser uma resposta adaptada ao ambiente mauritano, caracterizado pelo desemprego e uma forte precariedade da juventude. De forma geral, o ambiente mauritano não é particularmente favorável ao empreendedorismo. A falta flagrante de meios e de espaços disponíveis para os empreendedores, os baixos investimentos públicos na economia e a ausência das industrias locais, juntamente a infra-estruturas de base fracas (cortas de eletricidade diárias, estradas em péssimo estado, dificuldades para achar certos materiais, conexão Internet fraca, etc.): todos esses elementos não contribuem ao investimentos e ao desenvolvimento de uma cultura empreendedora.
Acima de tudo, a Mauritânia é caracterizada pela fraqueza do seu capital humano, dado o colapso do ensino público nas últimas décadas. Como ilustração, em 2019, o site oficial Mauribac apresentava uma taxa de admissão média de 7,26% na primeira sessão do exame final do décimo segundo ano (chamado o baccalauréat em francês). Fortemente afetados pelo fracasso escolar, os jovens sofrem além disso da falta de estruturas de formação profissional. Essa fraqueza do capital humano leva um problema, ou seja ela limita as oportunidades para os empreendedores terem uma equipa qualificada e sólida, e encontrarem na masse de jovens desempregados as habilidades apropriadas.
Essa realidade acompanha-se da ausência de organismos supostos trazer, no tecido económico, o capital de risco necessário para o investimento em projetos inovadores e criadores de empregos. O setor bancário, como os poderes públicos, que deveriam assumir essa função, faltam claramente. E a fraqueza da cultura empreendedora significa que as famílias têm muitas vezes certos receios em emprestar os fundos necessários à criação de um projeto de empresa. Os modos tradicionais de mutualização dos meios, como a tontina (tontine em francês), xitique ou crédito de poupança rotativa, não bastam para compensar a falta de capital de risco, e estão mais frequentemente relacionadas ao consumo do dia a dia ou ao trabalho doméstico do que ao empreendedorismo.
« Nesse contexto, explica Diarra, o fablab é um espaço muito dinâmico, porque não há muitas estruturas mauritanas ou empresas que podem acolher tanta gente para formar e oferecer estágios. A maioria dos jovens que chegam dizem-nos que nas empresas, eles fazem coisas muito básicas. O que é muito especial nos fablabs, é o fato que, quando vais lá, aprendes. Podes auto-formar-te, ter acesso ao material. Enquanto numa empresa, vais receber ordens para fazer tal tarefa, e só fazes isso. Num fablab, há mais liberdade de trabalho. Por exemplo, eu posso programar hoje para trabalhar na modelização 3D; amanhã, posso trabalhar no desenvolvimento de software; posso concertar, criar, fabricar, soldar ou dessoldar... Enquanto empresas são especializados. Vais ter uma empresa que só faz desenvolvimento Web. Os fablabs são mais diversos. »
Oumou Sow, 25 anos, encarregada de programas no fablab e graduada em Master em Engenharia de Sistemas de Informação, acrescenta: « Os jeunes precisam criar! Eles precisam ser orientados também, porque existem muitos empregos que desconhecemos. Tudo o que é makers ou criação de objetos por exemplo, as pessoas não conhecem. Eu, quando digo o que faço, as pessoas não entendem […]. Em Nouakchott, não vejo um outro lugar onde as pessoas podem ajudar-te no teu projeto, sem contrapartida. Vens, tens um projeto, trabalhas, e sem contrapartida, há pessoas que apoiam-te a realizar, sobretudo para os estudantes que levam uma tese na universidade. Quando vais nas empresas, as pessoas não se importam com você, não prestam atenção em você, enquanto há pessoas que estão ai, que podem apoiar-te a realizar o teu projeto. »
Envolvimento e perseverança são as chaves do sucesso. O que me motiva: ganhar conhecimento.
A inovação é uma porta para a evolução social e económica da Mauritânia.
A inovação é um processo dinâmico sem fim, uma espiral vertiginosa de progresso em direção a amanhãs que esperamos sempre cheios de espéras e de esperanças para a humanidade.
Trazer soluções inovadores para responder às exigências sociais e ambientais
Muitos projetos de inovação estão sendo desenvolvidos no Sahel Fablab, e dão à ação de InnovRIM uma dimensão tanto social como ecológica: recuperação de computadores re-condicionados em latas Jerrican (que protegem contra a poeira e transportem-se facilmente), concepção de fornos solares para lutar contra o consumo de lenha na área rural, formações em informático para jovens mulheres e raparigas descolarizadas no âmbito da rede « Mulheres & TIC » (Femmes & TIC em francês), cartografia das cidades de Nouakchott, Kaédi e Kiffa com o aplicativo Open Street Map, etc. A filosofia: a inovação frugal constitui uma chave do desenvolvimento sustentável.
« Hoje, explicava Diarra o ano passado, podemos dizer que fizemos muito progresso. Esse ano, tivemos que trabalhar com muitos projetos. » Desde 2018, um financiamento da União europeia relativo ao projeto « Juventude e Poder de Agir » (JPA), Jeunesse et Pouvoir d’Agir em francês, levado pela ONG francesa Grdr, permitiu dar uma aceleração ao fablab. « Graças à JPA, conseguimos adquirir todo o equipamento completo, além de alargar as nossas atividades no interior do país e de trabalhar sobre a nossa estratégia de longo prazo. Agora o lugar do fablab é realmente animado, e recebemos muita gente. Ainda essa manhã, eu estava com um professor em electrónico, que estava satisfeito com um rapariga que acompanhamos. Ele quer ver o lugar. Ele nos dizia que um lugar como esse completa a universidade, onde eles aprendem muito mais teoria, enquanto aqui no fablab, eles têm acesso a tudo, eles praticam, eles experimentam, eles mexem o material. Esse ano, recebemos muitos estagiários da universidade, e a boa notícia, é que todos aqueles que fizeram um estágio aqui tiveram a nota mais alta. Outro dia, um jovem que trabalhou na "casa inteligente" teve 18/20. Ano passado, foi igual. Mesmo quando os protótipos não são terminados, sabemos que o aluno trabalhou. »
Eu nunca vi um lugar como o fablab. Mesmo se houver outros, não acho que serão como o de InnovRIM. Vejo que eles são motivados, que têm muitos projetos, e esses projetos permitem que crianças e jovens, tanto escolarizados como descolarizados, tenham idéias e inovem, e criem projetos. […] Eu convido todos os jovens desempregados, sem formação, a virem aqui para formar-se, fazer um estágio, e talvez aqui eles terão idéias de projetos a desenvolver para o futuro.
Entre todos os projetos do fablab, dois importantes merecem de ser mencionados. O primeiro, chamado « KhomiAuto », é um sistema de irrigação automático, por gotejamento, com sensores para medir o grau de humidade do solo. O protótipo é acabado, mas a fase de implantação e a finalização « visual » do aparelha estão para fazer. « Um fablab é um sítio de prototipagem, nous explique Diarra, mas deve ser depois tornado operacional, com circuitos electrónicos. É essa habilidade que nos falta: fabricar um circuito electrónico. Mas tenho um irmão que acaba o seu estágio no Japão, e que vai nos ajudar a avançar sobre KhomiAuto. A caixa, podemos fabricá-la aqui com a impressor 3D, mas para o circuito electrónico, precisamos de alguém que tenha tempo. »
O fablab é um lugar de partilha e de descoberta. Eu penso que o Sahel Fablab vai crescer. Sempre, temos jovens que vêm fazer estágios. Antigamente,não enchiamos a sala; hoje, o espaço é animado.
Fazer bricolagem, é a minha paixão, e o fablab me permite fazê-lo. Estou na área da reciclagem, e estou aqui para colocar iss em prática.
Um outro projeto em andamento dá perspectivas ousadas à empresa do Sahel Fablab: três protótipos de máquinas para reciclar o plástico são em fase de finalização. Há dois anos mais ou menos, o fablab ganhou duas impressoras 3D que permitem fabricar todos os tipos de objetos de arte e de decoração (jóias, estatuetas, etc.), pequenos objetos práticos (tampas, chaveiros, parafusos, etc.), ou maquetas/modelos (de edifícios, de cidades, etc.). As oportunidades técnicas e até comerciais dessas máquinas-ferramentas são potencialmente enormes, mas a matéria-prima usada, os filamentos de plástico, é cara e difícil a achar na Mauritânia. É preciso portanto a importar, desde a França ou o Senegal, o que constitui um custo difícil a compensar. A ideia das máquinas que podem reciclar o plástico, em um país onde a coleta de lixo é verdadeiro desafio ambiental e sanitário, é então de equipar o Sahel Fablab para que ele possa produzir o material necessário para o uso das impressoras 3D.
« É um projeto em open source, acrescenta Diarra, seu inventor não vende a máquina. Sua ideia, é que você pode duplicar essa máquina, não importa onde você esteja. Essa é sua maneira de contribuir à proteção do meio ambiente. Esse projeto, vamos o levar completamente, e cada final de semana avançamos nisso. A vantagem, é que podemos fazer perguntas num forum, em inglês. Eles cartografaram todos os países onde [a máquina] foi reproduzida. Na Mauritânia, somos os primeiros, eles nos acrescentaram o outro dia. Enviamos fotos e explicamos a que ponto estávamos. O triturador não funcionou porque há peças que não encontramos aqui. Então fizemos a pergunta, e alguém nos enviou um link; as pessoas fizeram isso na África do Sul, que a vendem. »
A perspectiva de produzir os seus próprios filamentos de plástico para alimentar a impressora 3D, contribuindo ao mesmo tempo à redução de resíduos de plástico, pode constituir um novo impulso no Sahel Fablab. Não só porque contribuiria à sua visibilidade na área do desenvolvimento sustentável, mas também porque pode reduzir consideravelmente o custo de fabricação de objetos ou de maquetas, e a associação poderia portanto melhorar o seu modelo econômico, que ainda está em construção.
Um modelo económico ainda para definir e uma equipa a « consolidar »
A história do Sahel Fablab não foi sempre tranquilo, e o contexto nacional explica isso por parte. Antes de tudo, o desemprego enorme e uma forte precariedade social complicam o envolvimento voluntário de longo prazo, pois há uma pressão sobre os jovens, cujas famílias exigem que eles procuram uma renda. Portanto, a primeira dificuldade do Sahel Fablab, segundo Oumou, é « a equipa, que temos dificuldade em "solidificar", a concertar. Precisaríamos de uma equipa realmente estável. Não somos capazes de pagá-los. Não posso culpá-los porque eles precisam de dinheiro, então eles precisam ir procurar em outro lugar. Mas se tivéssemos uma equipa bastante fixe, acho que poderíamos fazer muitas coisas. » Diarra completa esta observação: « Ao nível dos recursos humanos, temos dificuldades. Internamente, estamos formando formadores homens e mulheres, para nos ajudar. Mas estamos sobrecarregado: gerimos a administração, e ao mesmo tempo a parte técnica. Gostaríamos liberar tudo o que tem a ver com o administrativo, para nos concentrar na parte técnica. Precisamos realmente de uma equipa. »
« Outro dia, conta ela ainda, um jovem que estava connosco, achou uma outra estrutura que lhe dava 5 000 ouguiyas [120 euros] por mês. Mas lá, ele pode ficar todo um dia sem fazer nada. A dificuldade, é pagar os recursos humanos. Os fablabs são supostos funcionar na base do voluntariado, mas na Mauritânia, esse conceito não funciona. […] Há pressões sociais: uma vez que acabaste os estudos, tens que trazer dinheiro. Se não o fazes, tens todos os problemas do mundo. Somos todos confrontados a esse problema. Mas eu acho que um jovem que acabou os seus estudos, qualquer sejam as restrições socio-culturais, deve aprender a ser competente. Porque mais cedo ou mais tarde, é nas competências que decidem-se os recrutamentos. Você pode ter diplomas, se você não tiver as competências, é complicado.O que há na cabeça, isso é que conta. O futuro não é nos convénios familiares. Tudo isso vai desaparecer pouco a pouco, e não é toda a gente que tem essas vantagens. »
Com as novas tecnologias, vamos seguir em frente e mudar a nossa vida! Pois ninguém é digno de ser, mas quem quer ser.
« Outra dificuldade, acrescenta Oumou, que é ligada à da equipa: "money" ! Precisamos ganhar dinheiro. » Em muitos países, sobretudo na Europa e nos Estados-Unidos, a maioria dos fablabs baseiam-se no trabalho de membros voluntários e podem esperar vivre com subvenções públicas do Estado ou de uma administração local. Empresas ou universidades também desenvolvem os seus próprios fablabs para fazer desses lugares espaços de pesquisa, de experimentação, de liberação das ideias e de criatividade.
Na Mauritânia, a novidade do conceito de fablab e o fraco interesse dos poderes públicos em direção ao meio associativo e à inovação tecnológica, complicam a situação de uma estrutura como InnovRIM que pretende levar um fablab aberto e gratuito. Há pouca esperança de que o apoio financeiro, técnico ou humano venha dos ministérios em carga das novas tecnologias ou do ensino superior; ainda menos de uma Wilaya (Região) de Nouakchott ou do município de Sebkha no qual está localizado o fablab. É portanto necessário inventar um modelo econômico viável. Mas como ganhar dinheiro? « Realizando projetos, nos responde Oumou. E oferecendo serviços também, para empresas, indivíduos, por exemplo para desenvolver sites Internet, fazer faixas, etc. Temos competências. Temos quase o material. Agora, é conseguir achar o mercado, prospectar. Mas se temos que ir em prospecção, é porque atrás, sabemos que há um mercado, e que dentro da nossa equipa há alguém a 100% certo para realizar a tarefa corretamente. »
Dado o contexto, é provável que o modelo econômico a ser inventado seja multifacetado e ofereça um mecanismo híbrido que coloca InnovRIM ao cruzamento entre o estatuto associativo puro baseado no voluntariado e nas contribuições dos membros, o da start-up que cria rendas, e o de ONG que responde a concursos (appels à projets em francês) e procuram o apoio de financiadores internacionais. De fato, hoje em dia, a grande maioria dos fundos do fablab é fornecida pelos projetos cofinanciados pela cooperação internacional, em particular a União europeia e a França. Pelos procedimentos e as agendas que eles impõem, esses projetos de desenvolvimento apresentam ao mesmo tempo a desvantagem de consumir muito tempo em termos de gestão administrativa e financeira; e a vantagem de impulsar as atividades dentro do Sahel Fablab e do equipamento do local, sob a pressão dos prazos estabelecidos pelos contratos de subvenção.
Ao longo prazo, no entanto, a ideia é permitir que a associação ganha em autonomia em relação aos financiadores da ajuda pública ao desenvolvimento. Isso por pelo menos duas razões. A primeira, para garantir que as atividades atendam às necessidades identificadas no Sahel Fablab, e não às necessidades dos doadores (em resuma, afim que InnovRIM não seja um tipo de « prestador de serviços » dos doadores, como muitas vezes se tornam as ONG que dependem da ajuda pública ao desenvolvimento). A segunda, para que as atividades do fablab não sejam dependentes dos concursos, o que representaria o risco que, entre dois concursos, pode ocorrer vários meses sem financiamento; além disso, a seleção nunca é garantida.
Ainda há outras soluções possíveis; por exemplo as prestações de serviços ou de formações, que podem trazer dinheiro e ao mesmo tempo dar rendas aos membros da associação. Acima de tudo, InnovRIM quer desenvolver o papel de incubadora que pode assumir o Sahel Fablab, estabelecendo um processo completo de acompanhamento estratégico e técnico de projetos inovadores de empreendedorismo. Dado que ainda há uma questão para resolver: como uma start-up que foi acompanha dentro do fablab e que tornou-se lucrativa pode « recompensar » a comunidade que a apoiou a progredir e a realizar sua ideia? A fórmula a achar deve permitir que os designs e os processos desenvolvidos nos fablabs sejam protegidos e vendidos por a sua ou o seu « inventor », mas ao mesmo tempo que permaneçam disponíveis para deixar a possibilidade aos membros da comunidade de os usar e de aprender deles. Além disso, mesmo se as empresas podem usar o fablab e assim trazer um benefício à comunidade: é possível imaginar que as atividades comerciais sejam prototipadas e acompanhadas lá, desde que não entrem em conflito com outros usos do espaço. São muitas as possibilidades para definir o modelo econômico viável e que beneficia a todos, mas elas ainda ficam para identificar e aprofundar. Será necessário um tipo de « contrato » entre o fablab e os empreendedores acompanhados? O futuro certamente dará forma a isso tudo.
Estou no fablab há três semanas. O que eu gosto aqui é a atmosfera, a maneira como as pessoas se organizam, e a comunicação.
Eu descobri muitas coisas no fablab. A atmosfera é agradável, as pessoas são gentilas. Eu senti-me vontade, fui bem acolhida. Estou aqui há três meses, e pedi para estender o meu estágio.
A ideia por trás: é possível « uma revolução digital na Mauritânia »!
A própria existência desse espaço colaborativo onde abundam as ideias e que valoriza o conceito de inovação e as novas tecnologias já é em si algo de bastante revolucionário na Mauritânia. Particularmente porque permite os encontros e a troca de ideias, num espírito de partilha do conhecimento. Oumou testemunha: « Encontrei muita gente, perfis muito diferentes. E isso trouxe-me conhecimentos também. Estudei cinco anos, mas o lado prático, não tínhamos feito isso muito. Aqui eu tive ocasião de desenvolver o que eu sabia, aplicar realmente. E ter mentores também, que ensinaram-me muitas coisas, que eu nunca tinha feito na escola. »
« Muitos jovens estão interessados em novas tecnologias, conclut Diarra. Eles são muito apaixonados. A coisa que lhes faltavam, era o acompanhamento. Se eles têm mais fablabs, tenho a certeza que haverá uma revolução digital na Mauritânia. Os fablabs vão surgir em todo lado: à universidade, nas escolas, etc. Haverá muitas oportunidades, e isso levará os jovens a serem criativos. Este lugar lhes permite romper com a solidão, ser criativos, empreender. »
Numa entrevista de 1985, o antigo presidente do Burkina Faso, Thomas Sankara, explicava que « não se faz transformações fundamentais sem um mínimo de loucura. Nesse caso, torna-se não-conformismo, coragem de virar as costas às fórmulas conhecidas, o de inventar o futuro. […] Devemos ousar inventar o futuro. » Desse elogio da loucura, da imaginação, da superação das barreiras admitidas, como vetor de transformações fundamentais, a comunidade do fablab é a audaciosa ilustração, e esperamos que ela continue a progredir, a inovar, a inventar.